domingo, 28 de junho de 2009

O GOVERNO

O governo não é.
O governo é o (des)governo.
O governo é uma cabine de comando
para poucos tripulantes.
Os passageiros passam.
Os governantes
e os seus apaniguados
ficam.
De alguma maneira
eles ficam.
Colados às asas da aeronave.
Ao teto.
Ao chão.
Principalmente ao chão,
ricos e felizes.

O GUARDA DE TRÂNSITO

Diante do trânsito
parado
congestionado
havia horas
o guarda de trânsito
sem trânsito
soltou o apito
e deu um grito
que ressou como
um eco
a v a s s a l a d o r
patético
que quebrou os vidros
dos carros
as vitrines das lojas
o asfalto
inrerrompeu o fluxo do tempo
e parou todos os relógios.

COISAS

Coisas amarelas
coisas azuis
coisas vermelhas
coisas verdes
coisas transparentes.

O mundo está lotado de coisas.

Coisas úteis
coisas inúteis
coisas prováveis
coisas improváveis.

Nesse emaranhado de coisas
não passamos de uma coisa
dentre muitas.

A CADEIRA

Para que serve
uma cadeira
além de ser
para sentar-se?

Para que serve
uma cadeira
além de ser
para subir nela
em substituição a uma escada?

Para que serve
uma cadeira
além de ser
como objeto de decoração?

Para que serve
uma cadeira
além de ser
como arma
para defender-se do inimigo?

Para que serve
uma cadeira
além
de ser
como arma
para atacar o inimigo?

Uma cadeira não servirá para nada
se diante dela
estiver um ser de outro planeta
que não sabe para que serve uma cadeira.

DENTRO DOS MEUS SONHOS

Dentro dos meus sonhos
sou muitos personagens
mirando
os avessos da manhã.

Densa é a noite
e os fantasmas da memória
que passeiam
na tela imensa
interna
narrando
o ir e o vir
da memória
plástica
elástica
que não para
de brotar.

sábado, 27 de junho de 2009

MICHAEL JACKSON

A vida
o sucesso
a fama
o dissolveram
aos poucos

o seu corpo
perdeu a cor
a vibração
a luz

mas a sua alma
canta
dança
a coreografia
do eterno.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

ENIGMA

Será que um elefante sabe
que um gato é um gato?

Será que um gato sabe
que um cachorro é um cachorro?

Será que um cachorro sabe
que uma formiga é uma formiga?

Será que sabemos quem somos?
Esse é o maior enigma.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

A Brincadeira do Sol

Sol brincando
de não sorrir
na manhã mais fria do ano.

Sol brincando
de não ser
na manhã mais fria do ano.

Sol brincando
de bom moço
na manhã mais fria do ano.

Sol brincando
de não queimar a pele
na manhã mais fria do ano.

Sol brincando
de dormir até mais tarde
na manhã mais fria do ano.

domingo, 21 de junho de 2009

O DESMATADOR

Quando não havia
mais árvores para derrubar
o desmatador
sentou-se
no deserto
e chorou
por não ter mais o que fazer.

A SERPENTE

A serpente
picou
em seguida
devorou
Adão e Eva
e mudou
a história do mundo
já no primeiro capítulo.

O HOMEM E O ANALISTA

O homem só
diante do analista
quer saber
mais sobre si.

O analista
coloca mais interrogações
na sua mente.

O homem vai embora
para casa
com uma caixa de interrogações.

Até a próxima sessão
pretende reduzir
a sua imensa coleção.

O LIVRO AUTOLIDO

O livro que se lê
a si mesmo
devora-se
a cada nova leitura.

No fim
páginas vazias
devoradas
imploram
para a capa
produzir
novas histórias.

ESPELHO ESPERA

espelho espera
áspera

áspera espera
do espelho

Espelho
espelhante
espalha
imagens
expandidas
pelo espaço

sexta-feira, 19 de junho de 2009

CADERNOS DA MEMÓRIA

Cadernos da memória

alguns intactos

outros apagados

tinta invisível

páginas esquecidas

mas querendo ser lidas.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

O FIM DO CORREDOR SEM FIM

O ruído vindo
do fundo do corredor
só aumentava.

E também o corredor
imenso
extenso
infinito

não havia fim
nem começo.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

DE TODAS AS MANEIRAS

Poesia exposta na praça
em varal.

Poesia falada em voz alta
no degrau
do teatro.

Poesia balbuciada.
Poesia gritada.

Poesia querendo ser dita
de todas as maneiras.

terça-feira, 16 de junho de 2009

SONORIZAR O AR

Sonorizar
a vida
o ar.

Sons de Bach
de Beethoven
de Chico
Caetano
eu quero ouvir
espalhados
por todos os lugares.

Vamos sonorizar
o ar.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

O LUSTRE

Na velha casa
quase demolida
o lustre
sem lâmpadas
resiste.

As paredes
estão vindo
abaixo
mas o lustre imponente
olha de cima
a destruição
que não termina.

domingo, 14 de junho de 2009

LUTA

O seu maior inimigo
estava no espelho.

Deu um soco
na sua imagem.

Destruiu-a
e levou dez pontos
no mão direita
que sujou
a casa inteira
de sangue.

sábado, 13 de junho de 2009

URBANOS

1
No meio do congestionamento
olho para a Lua
e a encontro
livre no espaço
sem congestionamento nenhum.

2
A cidade
é concreta.

A cidade
é uma prisão.

A cidade
foi encarcerada
em si mesma.


3

O homem empurrando
um carrinho
cheio de papéis velhos
circula
muito melhor
do que aquele homem
de Mercedes
que não sai do lugar
há cinco minutos.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

CADA SEGUNDO

Cada segundo
é infinito
e só termina
aparentemente.
Dentro dele
há uma pulsação
ininterrupta.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

O ARQUITETO DO DESERTO

O arquiteto
morador do deserto
construiu
um oásis
incerto

a água surgia e desaparecia
de acordo com a sua sede


o arquiteto construiu casas
que sumiam
ao mínimo vento

o efêmero
era o alicerce
de tantas construções
feitas e desfeitas
naquele espaço imenso
e nenhum.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

A ÁGUA E O DESERTO

Será sempre
a vontade de tomar
água
no meio do deserto.

O deserto é o homem
e a água é o desejo.

Nem sempre haverá água.
Quantas vezes morremos
de sedes várias
até nos esquecermos
que a água está em nós
não em oásis inacessíveis.

domingo, 7 de junho de 2009

PERGUNTA POÉTICA

Se o universo está
em expansão,
a poesia está se expandindo bem?

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A ILHA INABITÁVEL

Na ilha inabitável
do ser
o ilhado
que não se reconhece
não percebe
que na sua ilha
o vazio substituiu a sua essência.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

O RITO DE SER

O rito de ser.
O rito de não ser.
O rito de não entender o que se é.
O rito de se buscar
nas maranhas da mente
até se achar
na contracorrente.

terça-feira, 2 de junho de 2009

A NOITE INTERIOR

Ave
estrela
lua.

A noite
voou
dentro dele
e se transformou
em um céu perene
no seu corpo
e na sua mente.
Eternamente
lúdica.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

O PONTO CEGO

Em um ponto de luz
há um miniponto
cego
sombrio
sem luz dentro
que ilumine
os nanopontos da palavra
e dos minúsculos versos
que são escritos
numa região remota
do cérebro
do poeta
que nem percebe
que sua poesia
flui
pelos afluentes
do inconsciente
e da memória.